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Romantismo e Realismo

Em 1843, escrevia Ruskin, padrinho e defensor dos pré-rafaelitas: “Dirige te à Natureza com toda a singeleza do coração e caminha com ela, laboriosa e confiantemente, sem outro pensamento que não seja o de como apreender melhor o seu sentido, e lembra-te da instrução que ela te dá, sem nada rejeitar, sem nada desdenhar; acreditando que todas as coisas são justas e boas, e sempre regozijando na verdade.”

Por muito que a primeira irmandade pré-rafaelita se reclamasse “realista”, o seu programa é plenamente romântico: o reencontro do individuo com a natureza, despido dos requisitos da razão, conduz a uma verdade empirica, emocional e justa. Do dramatismo terrível de Gericault ás difusas paisagens de luz d Constable, passando pelas obras medievalist dos “Nazarenos” alemães, é a condição humana que se procura recuperar, e é na natureza que ela será encontrada – seja no céu tempestuoso que oprime os sobreviventes do Medusa, ou nas florestas primordiais dos pintores da escola do Hudson.

Na natureza, mas também no passado: o termo “romántico”, que se vulgarizou na Inglaterra do século XVIII, significava, aliás, originalmente “como um romance”, ou seja, partilhava da essência estranha e fantasiosa dos romances medievais. Foi muitas vezes nestes romances que o romantismo, individualista e nacionalista, procurou as suas lições. Tal como aconteceu com a natureza romântica – pristina e sábia-, também o passado foi reinventado como fonte de uma pureza original, entretanto perdida. Como os pré-rafaelitas e os nazarenos, também os irmãos Grimm, ou Alexandre Herculano, procuram na Idade Média (agora resgatada do seu estatuto bárbaro), os mitos fundadores para uma nova ordem política, para uma nova cultura nacional.

Mas se o romantismo se vira para tempos medievos, para os que vieram “antes Rafael”, e nasce, em grande parte, por oposição ao neo-classicismo, ele não deixa de ser, ainda, herdeiro do renascimento: rejeitando a razão, o cálculo e a idealização, retoma, porém, os valores do naturalismo, da observação e do indivíduo que Leonardo, ou Dürer inauguraram. E se o associamos à Revolução francesa, e o vemos suplantado, depois do Terror, pelo realismo de Courbet, declaradamente oposto ao sublime, somos, também nós, herdeiros do renascimento. O simbolismo, a segunda escola pré-rafaelita, a Arte Nova, e até, em parte, o impressionismo, são tributários daquele movimento: procuram a mesma verdade subjectiva, mesmo que esta só se venha a encontrar, como escrevia Burne-Jones “numa terra que ninguém pode definir, da qual ninguém se pode recordar, que apenas se pode desejar”.

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Romantismo e Realismo

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Em 1843, escrevia Ruskin, padrinho e defensor dos pré-rafaelitas: “Dirige te à Natureza com toda a singeleza do coração e caminha com ela, laboriosa e confiantemente, sem outro pensamento que não seja o de como apreender melhor o seu sentido, e lembra-te da instrução que ela te dá, sem nada rejeitar, sem nada desdenhar; acreditando que todas as coisas são justas e boas, e sempre regozijando na verdade.”

Por muito que a primeira irmandade pré-rafaelita se reclamasse “realista”, o seu programa é plenamente romântico: o reencontro do individuo com a natureza, despido dos requisitos da razão, conduz a uma verdade empirica, emocional e justa. Do dramatismo terrível de Gericault ás difusas paisagens de luz d Constable, passando pelas obras medievalist dos “Nazarenos” alemães, é a condição humana que se procura recuperar, e é na natureza que ela será encontrada – seja no céu tempestuoso que oprime os sobreviventes do Medusa, ou nas florestas primordiais dos pintores da escola do Hudson.

Na natureza, mas também no passado: o termo “romántico”, que se vulgarizou na Inglaterra do século XVIII, significava, aliás, originalmente “como um romance”, ou seja, partilhava da essência estranha e fantasiosa dos romances medievais. Foi muitas vezes nestes romances que o romantismo, individualista e nacionalista, procurou as suas lições. Tal como aconteceu com a natureza romântica – pristina e sábia-, também o passado foi reinventado como fonte de uma pureza original, entretanto perdida. Como os pré-rafaelitas e os nazarenos, também os irmãos Grimm, ou Alexandre Herculano, procuram na Idade Média (agora resgatada do seu estatuto bárbaro), os mitos fundadores para uma nova ordem política, para uma nova cultura nacional.

Mas se o romantismo se vira para tempos medievos, para os que vieram “antes Rafael”, e nasce, em grande parte, por oposição ao neo-classicismo, ele não deixa de ser, ainda, herdeiro do renascimento: rejeitando a razão, o cálculo e a idealização, retoma, porém, os valores do naturalismo, da observação e do indivíduo que Leonardo, ou Dürer inauguraram. E se o associamos à Revolução francesa, e o vemos suplantado, depois do Terror, pelo realismo de Courbet, declaradamente oposto ao sublime, somos, também nós, herdeiros do renascimento. O simbolismo, a segunda escola pré-rafaelita, a Arte Nova, e até, em parte, o impressionismo, são tributários daquele movimento: procuram a mesma verdade subjectiva, mesmo que esta só se venha a encontrar, como escrevia Burne-Jones “numa terra que ninguém pode definir, da qual ninguém se pode recordar, que apenas se pode desejar”.

Romantismo e Realismo de Cinzia Caiazzo. Público Comunicação Social. Porto, 2006, 359 págs. Mole.

Descrição

Em 1843, escrevia Ruskin, padrinho e defensor dos pré-rafaelitas: “Dirige te à Natureza com toda a singeleza do coração e caminha com ela, laboriosa e confiantemente, sem outro pensamento que não seja o de como apreender melhor o seu sentido, e lembra-te da instrução que ela te dá, sem nada rejeitar, sem nada desdenhar; acreditando que todas as coisas são justas e boas, e sempre regozijando na verdade.”

Por muito que a primeira irmandade pré-rafaelita se reclamasse “realista”, o seu programa é plenamente romântico: o reencontro do individuo com a natureza, despido dos requisitos da razão, conduz a uma verdade empirica, emocional e justa. Do dramatismo terrível de Gericault ás difusas paisagens de luz d Constable, passando pelas obras medievalist dos “Nazarenos” alemães, é a condição humana que se procura recuperar, e é na natureza que ela será encontrada – seja no céu tempestuoso que oprime os sobreviventes do Medusa, ou nas florestas primordiais dos pintores da escola do Hudson.

Na natureza, mas também no passado: o termo “romántico”, que se vulgarizou na Inglaterra do século XVIII, significava, aliás, originalmente “como um romance”, ou seja, partilhava da essência estranha e fantasiosa dos romances medievais. Foi muitas vezes nestes romances que o romantismo, individualista e nacionalista, procurou as suas lições. Tal como aconteceu com a natureza romântica – pristina e sábia-, também o passado foi reinventado como fonte de uma pureza original, entretanto perdida. Como os pré-rafaelitas e os nazarenos, também os irmãos Grimm, ou Alexandre Herculano, procuram na Idade Média (agora resgatada do seu estatuto bárbaro), os mitos fundadores para uma nova ordem política, para uma nova cultura nacional.

Mas se o romantismo se vira para tempos medievos, para os que vieram “antes Rafael”, e nasce, em grande parte, por oposição ao neo-classicismo, ele não deixa de ser, ainda, herdeiro do renascimento: rejeitando a razão, o cálculo e a idealização, retoma, porém, os valores do naturalismo, da observação e do indivíduo que Leonardo, ou Dürer inauguraram. E se o associamos à Revolução francesa, e o vemos suplantado, depois do Terror, pelo realismo de Courbet, declaradamente oposto ao sublime, somos, também nós, herdeiros do renascimento. O simbolismo, a segunda escola pré-rafaelita, a Arte Nova, e até, em parte, o impressionismo, são tributários daquele movimento: procuram a mesma verdade subjectiva, mesmo que esta só se venha a encontrar, como escrevia Burne-Jones “numa terra que ninguém pode definir, da qual ninguém se pode recordar, que apenas se pode desejar”.

Informação adicional

Peso 1450 g

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